A historia de um menino pobre que encontrou um tesouro.
Começou assim: um
garotinho estava diante de uma sepultura da sua
aldeiazinha natal, no norte superior da Alemanha, em
Mecklemburgo. Ai estava enterrado o malfeitor
Henninh, chamado
Bradenkielrl. Constava ter ele assinado e assado um pastor vivo e, já depois deste torrado, haver-
lê desferido ainda um pontapé. A vingança, diziam, manifestara da seguinte maneira: todos os anos o
pé esquerdo do facínora, calcado com uma meia de seda, tinha de brotar da sepultura.
O
garotinho esperou e nada aconteceu. Então pediu ao pai que fosse cavando e investigando para ver onde o
pé estaria naquele ano. Não longe dali havia um outeiro. Lá, segundo lhe contaram havia um berço de ouro. O menino perguntava ao pai, pobre e desmoralizado:
_ O senhor não tem dinheiro Por que não desenterras o berço
O pai contava sagas, contos de fadas e lendas ao menino. Falava-lhe sobre também – velho humanista – sobre as lutas dos heróis de Homero, sobre Paris e Helena, Aquiles e Heitor, a forte Tróia consumida pelas chamas. No Natal de 1829 deu-lhe um presente a Historia do Mundo Ilustrado de
Jerrer, nele continha uma gravura representando Eneias com o filho pela mão, fugindo da fortaleza em chamas. O menino olhava a gravura, os muros fortes, a sólida porta ocidental e perguntava:
_ Tróia era assim?
O pai acenava com a cabeça.
_ E tudo isso foi destruído, completamente destruído, e ninguém sabe onde era?
_Isso mesmo respondia o pai.
_ Não acredito, dizia o menino. Quando eu for grande, hei de encontrar
Tróia; e também o tesouro do rei.
O pai ria.
Quarenta e seis anos depois.
A maioria dos sábios contemporâneos designava como o possível sitio onde Tróia poderia ter ficado – se ela tivesse existido algum dia – a aldeola de
Bunarbashi, havia naquele lugar duas fontes que levavam os arqueólogos arrojados a opinião de que bem poderia ter sido ali a velha Tróia.
''E alcançaram as duas fontes de belas águas borbulhantes,
De onde parte, de dupla nascente, o Escamandro vertiginoso.
Uma corre sempre quente, e do fundo dela.
Sobem nuvens de fumo como uma fornalha;
Mas a outra mesmo no verão corre fria como granizo,
Ou como a neve de inverno e como gélidos blocos de gelo.''Assim diz

ia Homero no canto XXII da Ilíada, versos 147 a 152. Por quarenta e cinco
piastras Heinrich Schliemann contratou um guia, montou num cavalo sem rédea nem sela e lançou o primeiro olhar sobre a terra do sonho de infância.
Esse primeiro olhar, entretanto, já lhe mostrou que aquele lugar, a uma distancia de três horas do litoral, não podia ser o sitio de Tróia, visto que os heróis de Homero eram capazes de correr, varias vezes ao dia, dos seus navios ate o castelo. E naquela colina poderia ter-se erguido o castelo de
Priamo, com sessenta e duas dependências, muralhas
ciclópicas.
Schliemann que levava Homero ao
pé da letra
inspecionou as fontes e abanou a cabeça. Num espaço de quinhentos metros não contou duas (como declarou Homero), mas trinta e quatro fontes na mesma temperatura de
dezessete graus e meio.
A justificativa de sua duvida de que Tróia tivesse sido ali a ausência de qualquer vestígio de ruínas e ate de cacos de cerâmica e muralhas
ciclópicas não desaparecem sem deixar vestígios, e , contudo não havia sinal delas.
Havia porem sinal de outros sítios entre as ruínas de Nova
Ilion, hoje
Hissarlik, que significa Palácio, duas horas e meia de ao norte de
Bunarbashi, distante apenas uma hora da costa. Por duas vezes
Schliemann examinou o cume da colina que apresentava um planalto quadrangular, medindo 233 metros de lado e então se convenceu de ter achado Tróia.
Em 1869 ele casou-se com a grega Sofia
Engastromenos. Em
Abril de 1870 começou a cavar, em 1871 cavou durante dois meses e, nos dois anos seguintes, quatro meses por ano. A colina parecia uma imensa cebola que era preciso desfolhar camada por camada. E cada camada parecia ter sido habitada em tempos
diversissimo; povos viveram e morreram, uma civilização sucedera a outra, e sempre uma cidade dos vivos se erguera novamente sobre a cidade dos mortos.
Qual dessas nove cidades era, porem a Tróia de Homero?
Schliemann marcou provisoriamente 15 de
Julho de 1873 com

o ultimo dia das escavações. E então na véspera, achou aquilo que havia de coroar sua obra com brilho de ouro e encantar o mundo.
Dispensou os cem trabalhadores, a mulher segurava o chalé e este se enchia de tesouros cujo valor parecia impossível de calcular. O tesouro de
Priamo! O tesouro de um dos mais poderosos
reis de tempos
remotíssimos, impregnados de sangue e
lágrimas, adorno de homens semelhantes aos deuses, enterrado há três mil anos e tirado de baixo das muralhas de entulho de sete reinos perdidos para a luz de um novo dia!
Schliemann não duvidou nem por um instante que tinha achado o tesouro de
Priamo.
Somente pouco antes de sua morte se provou que ele havia se deixado iludir pela embriagues do seu entusiasmo; que Tróia ficava, não na segunda nem na terceira camada e sim na sexta camada a contar de baixo e que o tesouro pertencera a um reino mais antigo do que de
Priamo.
Tal êxito poderia ser ainda suplantado?
Resumo feito do Livro Deuses, Túmulos e Sábios de C. W. Ceram
Traduzido por João Távora, Editora Melhoramentos, 12 edição Abril de 1970.